Sim, toma de graça a falta,
a causa de tanta desgraça.
A musa nua, mulher despida, ferida a gosto. Belo gosto. Há um tanto de história por trás da carne, que mostra que é vida encarnada, o fruto da flor e também a seiva que banha este velho.
Moça que já foi menina, conta-me um tanto do teu bairro, das aventuras, do céu que te alegra, daquilo que melhor te cerca.
Por dentro desses galhos velhos, espero tua seiva, para que cresça a mesma rosa do teu bairro, das tuas aventuras e do teu jardim.
L.C.M (original do dia 13/10/2018)
Natureza que assopra meus pulmões, que sem pedir nutre minhas veias, que faz células vagarem por organismos, travando guerras silenciosas, fazendo de nós sujeitos, plateia e olimpo. Estamos mesmo todos sujeitos a ela, que tanto dá ao amigo quanto ao inimigo. Amiga da moléstia e do sorriso, que arranca toda vida desse pedaço de chão, que traça o começo, o meio e o fim.
Gaia, se sinto imensa felicidade pelo simples voar de um passarinho e extremo pesar pelas tragédias que vivo, o quão absurdo é tudo isso? Sinto que és mãe de tudo, do pássaro, da tragédia, da minha felicidade, que como todo o resto apenas acontece e só isso. Sem que nada em teu seio tenha o número ou o grau que em muitas de minhas preces eu já tenha pedido, enquanto relutava em ver que és o próprio sentido. L.C.M (original do dia 15/08/2018)
Sou só um homem. E o que isso quer dizer, afinal de contas? Para responder qualquer baboseira esotérica, chamem um xamã. Não, um xamã não; alguém mais inútil, quem sabe um pastor, daquele tipo que faz um bem danado. Ali, do outro lado da rua, um homem no chão, um homem de terno. Quem sabe ser homem é só saber usar pano para se cobrir e para se dizer de ali ou de lá. Homens, para que os quero? Quem disse que quero? Talvez seja isso, no fim das contas: se identificar com aquilo que mais odeia e que mais ama. L.C.M (original do dia 02/06/2018)
Após desbravar discursos turvos dos bravos laureados ocupantes das cadeiras enfeitadas de insegurança, deparei-me com o louco, o animal, e, como todo privado, gostei. Há tempos não via por estas bandas um pouco de sangue e, imaginem só, de repente, eu, um macaco perdido no cosmos, num verdadeiro deserto de vozes fantasmagóricas, encontrar um fragmento de vida vermelho. Doutos dos doutos, belos farsantes, onde estão os doutos das matérias mundanas? Daquele mundo que na infância vivi. Será que os doutos dos doutos, supérfluos como são, se aproveitaram da doutrina dos inocentes?
Se não se pode ver os sábios, apenas feiticeiros, só se trata de ambiente. Sei que, nas lacunas, como o sangue que por trás das palavras está encoberto, eles também estão, nutrindo-se daquilo que ainda é real.
E que a luta continue.
L.C.M (original do dia 02/06/2018)
Milagres existem, mas não são as operações de um ente de natureza diferente da nossa. São muito menos uma coisa sem causa, e até podemos dizer que são indeterminados, mas apenas no sentido de que sabemos do nosso estado atual de ignorância.
Contudo, ainda não se pode dizer que o milagre é simplesmente o imprevisto, pois há imprevistos desastrosos. É necessário que seja aprazível para aquele que não prevê.
Podemos dizer que a vida de uma criança está repleta de milagres, pois operam sobre um mundo que ainda não conhecem e, por algum motivo, talvez filogenético, têm extremo prazer em observar novos eventos e funções.
Para um adulto, o evento e suas variáveis independentes podem ser de conhecimento antigo e já não se caracterizam como um milagre. A mágica só é mágica quando não se conhecem as causas do evento; além disso, ela pode perder a graça ou até ser aversiva se continuarmos a entrar em contato com ela constantemente.
Um cientista procura milagres, os descreve e analisa, para que não se tornem aversivos e possam dar acesso a novos milagres.
Por definição, o milagre não é previsível para uma pessoa ou comunidade específica, o que não significa que o evento seja indeterminado no sentido de que não há variáveis independentes das quais ele seja função. Também deve ser aprazível para os que não podem prever; o infortúnio do inimigo é um ótimo exemplo de milagre.